Cidade Informal

26/03/2008 08:10
A “cidade informal” sob um olhar especializado
Luciane Teixeira

São Sebastião

Os assentamentos precários como os loteamentos irregulares, geralmente não atendem aos padrões urbanísticos ambientais estabelecidos pelas legislações urbanísticas e são constituídos de maneira informal e irregular.
Fotos Bruno Rocha
Construções irregulares na costa sul de São Sebastião misturam edificações de madeira, blocos, alvenaria e materiais diversos

São os locais onde vivem a população de baixa renda, gerando impactos negativos tanto no aspecto social como no meio ambiente. Essa população não tem a propriedade e sim a posse dessas áreas, sendo que muitas delas, no caso de São Sebastião, são áreas de risco, protegidas e dentro da área de Parque Estadual da Serra do Mar (PESM).

Para que se possa encontrar um equilíbrio e buscar a conformidade para essas situações, entende-se que a urbanização e regularização dos assentamentos precários devem ser definidas como prioridades no campo da política urbana, tendo como fundamento a efetividade do Direito à Moradia.

De acordo com Luiz Cláudio Romanelli, formado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC) e especialista em Gestão Técnica do Meio Urbano pela PUC/PR e Université de Technologie de Compiègne, na França, os programas de regularização têm uma natureza essencialmente curativa e não podem ser dissociados de um conjunto mais amplo de políticas púbicas, diretrizes de planejamento e estratégias de gestão urbana destinadas a reverter o atual padrão excludente de crescimento urbano.

“Por um lado, é preciso ampliar o acesso ao mercado formal a uma parcela mais ampla da sociedade, sobretudo, os grupos de renda média-baixa, ao lado da oferta de subsídios públicos para as faixas da menor renda. Por outro lado, é preciso rever os modelos urbanísticos que têm sido utilizados, de forma a adaptá-los às realidades socioeconômicas e à limitada capacidade de ação institucional das agências públicas”, declara.

“Nesse contexto, as políticas de regularização fundiária não podem ser formuladas de maneira isolada e necessitam ser combinadas com outras políticas públicas preventivas para quebrar o ciclo de exclusão que tem gerado a informalidade. Isso requer intervenção direta e investimento público, sobretudo por parte dos municípios, para produzir opções de moradia, democratizar o acesso à terra e promover uma reforma urbana ampla”, enfatiza Luiz Cláudio. “Regularizar sem interromper o ciclo de produção da irregularidade, além de renovar o sofrimento da população, provoca a multiplicação permanente da demanda por recursos públicos”, complementa.

Segundo ele, para que tudo isso ocorra, a existência de um contexto político, econômico, legal e de financiamento favorável precisa contemplar a necessidade de implementação de programas, que contenham objetivos cuidadosamente adaptados à cada situação específica, a capacidade das autoridades públicas e dos agentes privados em oferecerem um conjunto de alternativas, que incida sobre as necessidades das pessoas, no que se refere ao tamanho das famílias. Além disso, a capacidade de implementar o programa de regularização, integrados a um projeto mais amplo de políticas voltadas ao desenvolvimento urbano e a produção de moradias.

Para ele, a criação de um processo de divulgação e de convencimento, também faz parte desse processo, para que a população beneficiada pela regularização possa compreender e tornar-se apoiadora dessa política. O convencimento não deve atingir somente as classes baixas, deve também ser feito em conjunto com as elites para que haja a inclusão das populações pobres com seus capitais na sociedade.
Outros fatores, que também incidem sobre esta situação são a criação de parcerias no trabalho específico de topografia, levantamento planialtimétrico e a decretação da área.

A partir deste ponto, os moradores buscam a regularização dos impostos IPTU, que deve ser equivalente a renda da família, entre outras condicionantes. E, aí, então, desponta-se o começo da justiça social das classes.

Um argumento trazido pelo economista peruano, Hernando de Soto, calculou que “no mundo em desenvolvimento foram investidos na produção informal de lotes, de casas e negócios informais, cerca de 9,3 trilhões de dólares, que ele chama de “capital morto”, pois não é reconhecido pela ordem jurídica. Desse modo, tal capital não gera acesso ao crédito, não permitindo também a circulação desse dinheiro na economia como um todo e na economia urbana, em particular”.

Urbanismo

O urbanismo pode ser chamado de sinônimo de planejamento urbano e, segundo especialistas da área, as cidades brasileiras, na melhor das hipóteses, são simples traçados urbanos convencionais, sem regulamentação de zoneamento, sem hierarquização de vias e, sobretudo, sem a implementação necessária e indispensável ao prosseguimento do processo de planejamento.
Daí surgem os problemas urbanos relacionados a esses fatores: moradias irregulares e suas conseqüências (poluição das águas, solo), trânsito, entre outros.

Baseado em seu trabalho acadêmico voltado para a questão do urbanismo, o diretor e arquiteto da Ong Onda Verde, de Caraguatatuba, Paulo André, revela como pode ser elaborado um plano urbanístico de base, direcionado para qualquer cidade.

Segundo ele, levando-se em consideração o uso e a ocupação do solo, para se obter uma cidade eficiente e bem organizada, não basta ter boas vias de circulação, edifícios, jardins públicos e boa infra-estrutura. Neste caso, é necessário que esses componentes do aglomerado estejam corretamente dimensionados e bem distribuídos pelo território urbano. “Uma das regras básicas na organização do espaço urbano, que não deve ser esquecida por prefeitos, vereadores e urbanistas é a de que o sistema viário e as funções urbanas são interdependentes”, disse André. Segundo ele, o sistema viário induz a localização das atividades e a qualidade das atividades depende da eficiência do sistema viário.
A quantidade e a distribuição territorial do espaço reservado para cada função, no aglomerado urbano, também são considerados fatores importantes para a manutenção de seu equilíbrio.

“Deve-se assegurar espaços suficientes e adequadamente localizados para a expansão industrial, para a formação de núcleos comerciais e de serviços, para a construção de habitações, sem esquecer as áreas verdes, as praças e os parques”, complementa o arquiteto.
Os fatores que envolvem a organização urbana devem estar num só documento legal: a lei do Zoneamento, que é a síntese do planejamento físico territorial. “É uma legislação que disciplina o uso (residencial, comercial, de serviços industrial, social) e a ocupação do solo urbano (a intensidade de utilização do lote).

A poluição ambiental que afeta as cidades comprometendo a qualidade da vida urbana; as áreas verdes no ambiente urbano (a Organização das Nações Unidas (ONU), recomenda um índice per capita de áreas verdes urbanas de, no mínimo, de 12 metros quadrados por habitante), o plantio de espécies nessas áreas; a maneira correta de criar as vias de circulação para veículos e pedestres; o tipo de pavimentação usado; a sinalização; o investimento no transporte coletivo e na habitação para a população carente; assim como, os problemas de saúde, educação, qualificação profissional e emprego, são todos fatores envolvidos dentro do mesmo processo de urbanização.

A intervenção direta do poder público pode ser feita por projeto de renovação urbana com desapropriações, demolições e construções. É uma opção evasiva e pode causar trauma social e econômico, resultante de remoção forçada de moradores e de atividades naquele local, segundo André. Neste caso, corre-se o risco de abandonar um projeto por exaustão dos recursos ou mudanças do governo.

A intervenção indireta do poder público e a mais usada é a legislação de zoneamento. Com isso, apode-se estimular a renovação espontânea da população com pequeno impacto sobre o orçamento público e riscos menores de abandono do projeto. A desvantagem é a lentidão desse processo. Existe também a intervenção mista, combinando legislação e estímulos tributários com alguns investimentos públicos na melhoria da infra-estrutura, das condições de acesso à área e da paisagem urbana. De acordo com André, esta alternativa é quase sempre o melhor caminho para combater a deterioração urbana.


Possíveis soluções

• Congestionamento de trânsito: limitar o acesso de veículos às áreas; ampliar as vias de circulação; eliminar o estacionamento de veículos no leito carroçável; redirecionar o trânsito de passagem; estimular mudança de uso na área.
• Insuficiência da Infra - estrutura: limitar o adensamento demográfico; limitar o coeficiente de aproveitamento dos lotes; estimular mudanças de uso na área; melhorar a infra-estrutura existente.
• Paisagem urbana: abrir espaço para praça jardins e outros tipos de lazer; estimular a ampliação ou pelo menos a preservação das áreas verdes particulares;
• Superestrutura deteriorada: reformar prédios e construções; demolir e reconstruir; estimular, mediante legislação tributária e de zoneamento, a recuperação ou substituição da superestrutura.
• População, qualidade e quantidade: coibir atividades anti-sociais e desenvolver programas de promoção social;

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